Como Adaptar a Rotina para Crianças Autistas
Pequenas mudanças que fazem grande diferença no bem-estar e na organização familiar.
Como Adaptar a Rotina para Crianças Autistas
Olá, tudo bem? Se você também é mãe ou pai de uma criança autista, provavelmente já percebeu que oferecer uma rotina estruturada é muito mais que uma “organização do dia” é parte do cuidado com o bem-estar da criança.
Aqui em casa, a rotina não é feita de horários rígidos ou planilhas milimetricamente marcadas. Ela é feita de repetições, consistência, previsibilidade... e muito, mas muito amor. Hoje eu quero dividir com você como isso funciona na prática com o Noah, meu filho autista de 6 anos, que está na fase pré-verbal.
Por que a rotina é tão importante para crianças autistas?
Crianças autistas se sentem mais seguras quando sabem o que esperar. Mudanças bruscas podem causar ansiedade, crises ou simplesmente desorganizar o emocional da criança. Uma rotina previsível ajuda o Noah a se regular melhor e torna tudo mais leve pra todo mundo aqui em casa.
Mas é importante dizer: a rotina não precisa ser engessada. O segredo é manter uma estrutura que a criança possa reconhecer, com atividades que se repetem, no mesmo ambiente e em uma sequência mais ou menos parecida todos os dias.
Como criar uma rotina eficiente?
Aqui vão algumas coisas que funcionam muito com o Noah e que podem ajudar aí na sua casa também:
- Aposte na previsibilidade: usamos fotos para mostrar onde vamos, e na volta mostramos a foto de casa. Isso ajuda muito! Essas fotos podem ser impressas como cartões (tipo crachás), estar no iPad ou no celular.
- Inclua o que a criança gosta: no caso do Noah, por exemplo, picar plantinhas e papel higiênico são formas de regulação sensorial super importantes pra ele.
- Mantenha a consistência: mesmo que pareça que a criança não entende, continue repetindo. O apoio visual é essencial para que a informação não fique abstrata. Às vezes os resultados demoram meses, mas quando chegam, fazem valer todo o esforço.
- Paciência é essencial: é normal parecer que nada está funcionando no começo. O segredo é insistir com carinho. Quando finalmente você obtém sucesso em algo que vem estimulando há meses, percebe que aquela habilidade estava sendo construída dia a dia, degrau por degrau, mesmo quando parecia em vão.
Como estruturamos a rotina aqui em casa
A seguir, compartilho como organizamos os dias aqui em casa, respeitando o tempo e as necessidades do Noah. Não seguimos um cronograma fixo, mas mantemos uma sequência consistente de atividades.
- ☀️ Manhã
Entre 7h e 8h: Acordamos e levamos o Noah para fazer xixi (estamos no desfralde noturno). Ele dorme sem fralda.
Depois, voltamos pra cama e ficamos uns 10 minutos abraçados. Sempre digo "bom dia", mesmo que ele não responda.
Trocamos de roupa, escovamos os dentes, penteamos o cabelo e descemos para a cozinha.
Enquanto preparo o café, ele brinca na balança da sala (ajuda na regulação).
Chamo ele para comer. Se não quiser, tudo bem. Ofereço sem forçar.
Às 9h ele vai para a escola. Antes de sair, tem um ritual: ele pica as plantinhas da entrada da casa. Isso ajuda muito na regulação sensorial antes do trajeto (cerca de 20 minutos). - 🌥️Tarde
Por volta das 14h, ele volta da escola.
Lavamos as mãos e sentamos para almoçar. Se ele não quiser, respeito e ofereço mais tarde.
Tiramos o uniforme e ele brinca livremente ou vamos à piscina (atividade favorita).
É nesse período que acontecem consultas, dentista, terapias, etc. Sempre usamos suporte visual com fotos ao sair e na volta para casa. - 🛒Como criamos uma rotina para o mercado
Hoje ele já consegue ir ao mercado, porque criamos um "roteiro" que o ajuda a se sentir mais seguro.
Ele senta no carrinho, vai direto para a sessão de pães e escolhe o mesmo pão.
Enquanto come, fazemos as compras e já estamos no caixa quando ele termina.
Usa abafador de ruído, o que ajuda bastante. Antes ele chorava ao chegar no mercado, agora não reclama mais. Uma grande evolução! - 🌠Final da tarde e noite
Entre 16h e 17h: é hora do banho. Aproveito para estimular: nomear partes do corpo, comandos simples (tirar roupa, colocar no cesto).
Por volta das 18h/19h: última refeição do dia, junto com o remédio.
19h30 ou 20h: ritual de sono. Escovamos os dentes, pijama e vamos para a cama.
Nosso momento preferido: os três (eu, papai e o Noah) deitados, cantando, fazendo bagunça. Depois, luz apagada, porta fechada, quarto escuro e silêncio. Ele dorme por volta das 21h.
Considerações finais
A rotina aqui em casa está longe de ser perfeita. Tem dias em que tudo sai do controle: o Noah não quer comer, sair ou dormir e tudo bem. Mas, no geral, mesmo sem ser uma rotina totalmente estruturada, nossos dias seguem um ritmo parecido. E isso faz muita diferença: percebemos o quanto o Noah fica mais calmo e regulado quando a rotina se mantém, e o quanto ele se desregula e se irrita quando há muitas mudanças.
Vou te propor um exercício simples. Imagine que você acordou hoje sem saber nada sobre o seu dia. Alguém escolhe sua roupa, prepara sua comida sem te perguntar o que você gostaria de comer, te coloca num carro e começa a dirigir sem te dizer onde estão indo ou o que vão fazer. Você segue o dia inteiro sem ter ideia do que está por vir. Como você se sentiria?
Foi só ao fazer esse exercício que eu entendi o quanto pode ser desesperador, para o meu filho que ainda não fala, não saber o que vai acontecer. Percebi que, no lugar dele, eu também ficaria ansiosa, insegura e desregulada. Não é frescura é sobre sentir medo do imprevisível.
O mais importante é que ele sinta segurança e previsibilidade. Ter empatia, paciência, consistência e respeitá-lo é o que tem feito a diferença de verdade.
Espero que esse relato inspire você a adaptar uma rotina que funcione aí na sua casa também. E mais do que isso, eu espero que você possa perceber a importância e a diferença que uma rotina irá fazer para o seu filho.
Com carinho,
Michele Leite
Mãe do Noah e sua companheira de jornada 💙