Regressão no autismo: o que é, por que acontece e como agir
Entenda o que está por trás da perda de habilidades em algumas crianças autistas e como os pais podem agir com calma e segurança diante desse momento.
Regressão no autismo: o que é, por que acontece e como agir
Um dos momentos mais angustiantes para os pais é quando percebem que o filho, que antes falava algumas palavras, olhava nos olhos e realizava certas tarefas, de repente para de fazer tudo isso.
Esse fenômeno é conhecido como regressão no autismo, e embora assuste, é muito mais comum do que imaginamos e também não significa que todo o progresso foi perdido.
Entender o que é essa regressão e por que ela acontece é essencial para agir com calma e oferecer o suporte adequado para o seu filho.
🧩 O que é regressão no autismo
A regressão acontece quando uma criança perde habilidades que já havia adquirido, como falar, olhar nos olhos, brincar de forma interativa, se alimentar sozinha, etc.
Em geral, isso ocorre entre 1 ano e meio e 3 anos de idade, fase em que o desenvolvimento cerebral passa por mudanças intensas.
Essa perda de habilidades pode acontecer de forma gradual ou repentina, e costuma estar relacionada ao início dos sinais mais evidentes do transtorno do espectro autista (TEA).
Geralmente é nessa fase que os pais começam a suspeitar que há algo de diferente no desenvolvimento do seu filho.
🧠 Por que a regressão acontece
A ciência ainda estuda as causas exatas da regressão no autismo, mas já existem algumas explicações que ajudam a compreender o que está por trás desse processo.
✂️ Diferenças na poda neuronal
Durante o desenvolvimento, o cérebro realiza um processo chamado poda neuronal, em que elimina conexões que não são usadas com frequência para tornar o funcionamento mais eficiente.
Em algumas crianças autistas, essa poda pode acontecer de forma diferente ou desorganizada, eliminando conexões que ainda eram importantes, o que pode levar à perda temporária de habilidades, como linguagem, contato visual ou interação social.
🤯 Sobrecarga sensorial e emocional
Crianças autistas são naturalmente mais sensíveis a estímulos e emoções. Mudanças de rotina, estresse, doenças ou excesso de estímulos podem sobrecarregar o cérebro.
Quando a criança autista está sobrecarregada sensorialmente ou emocionalmente, o cérebro dela entra em estado de proteção.
Nesse momento, ele reduz funções que exigem mais energia e que dependem de organização e disponibilidade cognitiva, como por exemplo a fala, interação social, comunicação, contato visual, brincadeiras, etc.
Por isso, a criança pode recuar para comportamentos mais automáticos e previsíveis, como balançar o corpo, bater as mãos, andar em círculos, repetir frases ou querer ficar sozinha.
Não significa que ela desaprendeu. É como se o cérebro dela estivesse dizendo: “Agora eu não consigo manter tudo isso. Vou desligar algumas funções para me proteger.” Ou seja, o foco do cérebro neste momento não é aprender, mas se regular para voltar ao equilíbrio.
🧬Influências genéticas e neurológicas
Já é sabido que o autismo tem uma forte influência genética. Algumas diferenças nos genes que controlam o desenvolvimento e a comunicação entre os neurônios podem tornar o cérebro mais sensível a mudanças internas.
Isso significa que, em fases de intensa reorganização cerebral (como aos 2 anos de idade, durante a primeira poda neuronal), o cérebro pode “remodelar” suas conexões de forma diferente.
Essa reorganização, embora natural, pode causar perdas temporárias de habilidades, algo que assusta os pais, mas que faz parte de como o cérebro autista funciona.
O importante é lembrar que o cérebro tem grande capacidade de se adaptar e criar novas conexões, e com as intervenções adequadas, essas habilidades podem ser retomadas e até fortalecidas com o tempo.
🔎 Como identificar uma possível regressão
Nem toda mudança no comportamento significa que é uma regressão. Às vezes, o que parece uma perda pode ser apenas uma reorganização do desenvolvimento, quando a criança foca energia em outras habilidades.
Mas é importante observar com atenção se:
a criança parou de falar ou reduziu muito o vocabulário;
evita o olhar ou o contato social que antes tinha;
perdeu o interesse por brincadeiras interativas;
demonstra irritabilidade, isolamento ou regressão alimentar;
ou retornou a comportamentos anteriores, como por exemplo o uso de mamadeira ou dificuldade para dormir sozinha.
Se esses sinais persistirem por semanas, é importante buscar avaliação profissional com um neuropediatra ou psiquiatra infantil especializado em TEA.
🫶 Como agir quando há uma regressão
Mantenha a calma.
Eu sei o quanto é difícil, mas o desespero não ajuda. Lembre-se: regressão não é retrocesso definitivo. O cérebro da criança continua aprendendo e se reorganizando.Procure ajuda profissional.
O neuropediatra, pediatra infantil vai poder fazer um avaliação e te orientar. Caso o seu filho já faça terapia, converse com o terapeuta sobre uma possível adaptação do plano terapêutico, como incluir novas abordagens ou investigar causas físicas (como infecções, sono irregular ou crises sensoriais).Reforce o ambiente previsível e acolhedor.
Crianças autistas se sentem mais seguras com rotinas claras e consistentes. Evite mudanças bruscas e ofereça suporte emocional, evitando assim uma sobrecarga sensorial e emocional.Valorize pequenas conquistas.
Mesmo que a criança tenha “perdido” uma habilidade, continue celebrando o que ela ainda faz. Isso reforça a confiança e estimula o aprendizado.Evite comparações.
Cada criança tem seu tempo e seu ritmo. O importante é caminhar junto, com amor e paciência.
🌈 A regressão também pode trazer respostas
A regressão é um momento que assusta, eu sei. Ver o filho deixar de fazer algo que já fazia pode doer profundamente.
Mas ela também pode ser um convite para enxergar o que está acontecendo por dentro, uma sinalização do cérebro dizendo que precisa desacelerar, se reorganizar.
A boa notícia é que o cérebro autista também é incrivelmente plástico. Com o suporte certo, tempo, acolhimento e intervenções adequadas, muitas crianças recuperam sim as habilidades que pareciam ter “perdido”.
O mais importante é lembrar que a regressão não é culpa de ninguém, ela não é fracasso, não é falta de estímulo, não é descuido. Precisamos entender que o desenvolvimento do cérebro autista não segue uma linha reta, mas um caminho com curvas, pausas e recomeços.
Com paciência, presença e um olhar atento às necessidades da criança, é possível atravessar essa fase e continuar avançando, um passo de cada vez.
Com carinho,
Michele Leite
Mãe do Noah e sua companheira de jornada 💙